Do tempo, da poesia e da memória: FESPOFALE 2023
Quando penso em poesia penso em vida. Não vida-tempo, mas vida como elemento fundante de nossos corpos, e assim é a poesia para mim: ora lírica, ora crítica, ora dor, ora delícia-prazer. Estância é abençoada com a verve e a vontade da arte, de tudo se faz manualidade-alimento, de tudo se faz palavra-batuque; de tudo se constrói costumes. Mas o que o tempo faz com a cultura? Atualiza, paralisa ou apaga? Ou ainda, o que o tempo faz com os agentes da cultura? Leva, resguarda ou eterniza? Não tenho certeza das respostas, tampouco sei se as tenho, mas depois de 40 anos de Festival de Poesia Falada de Estância pude ter uma noção vivida do que é cultura e de como ela precisa do tempo e de corpos-dispostos para se manter. A diversidade cultural de Estância precisa de memória, precisa de pertencimento e coragem para atravessar o tempo e ainda assim ser viva.
O Clube dos Poetas Estancianos, entidade que atualmente realiza o FESPOFALE, celebrou tudo aquilo que ainda é vivo: a poesia falada – que não precisa de nada além do poeta e a vontade do dizer; o criticismo poético – caro aos intelectuais atentos as dores do seu tempo; e a memória de quem fundou – dos anos de potencia e coragem do Grupo Lua Nova. Na festiva noite de 04 de maio de 2023, vi olhos-infantes atentos; vi olhos-maduros marejados; vi corpo seminu com coragem de falar; vi vontade de liberdade; vi perspectivas para além da ponte; vi poetas fundadores e novos, todos no mesmo lugar. Toda poesia exposta na luminescência do palco e dos assentos. Parte de nossa diversa cultura num só momento: música que louva e eleva os corações sensíveis; dança que nos emociona e nos instiga ao movimento.
A poesia não é só palavra – nada tem nela de grafismo-estático – a poesia é atravessamento, é subjetividade, é tudo que comunica e toca. Aos 40 anos de Festival de Poesia Falada fica o registro e o poder da ancestralidade e do tempo, a presença-criança no palco que sustém e faz brilhar o verde esperança das bodas de esmeralda e dos anos que ainda virão.
Thalita Síntique dos Santos